álbuns atrasados

Marina Teixeira
5 min readJun 13, 2022

--

e eu tenho OPINIÕES sobre eles

Hoje eu vim falar sobre dois álbuns que deveria ter falado mês passado, mas minha vida tá uma loucura e preferi juntar os dois num texto só: “Mr. Morale & The Big Steppers”, do Kendrick Lamar, e “Harry’s House”, do Harry Styles.

Os dois álbuns trabalham com uma certa introspecção, mas com resultados diferentes. Claro que são álbuns de gêneros distintos, mas de alguma forma, esse olhar para dentro foi parecido, só que com direcionamentos distintos. Vou explicar com calma.

O jazzy Kendrick está de volta (que a gente viu bastante no To Pimp a Butterfly), menos olhando para fora, mais olhando para dentro; o álbum funciona mesmo como uma sessão de terapia, onde nós acabamos sendo os terapeutas. Na pauta, traição (ele traiu a esposa), religiosidade, o mundo que ele passa a enfrentar após a COVID-19 (onde dá a entender que ele era antivax…). Eu particularmente não sou lááá muito fã dessa abordagem muito interna, onde você parece estar lendo algo que você não deveria, mas vida que segue.

O problema é quando o álbum é tão fechado em si e ele não se abre para quem quiser ouvir. Por vezes, é melhor você deixar suas observações num diário…
No geral, é um álbum menos político — que não é o que meio mundo esperava dele, todos esperavam Kendrick apontando o dedo pra geral — e muito mais focado em si, nos problemas familiares, em sua espiritualidade, e dá pra sentir, de alguma forma, que ele tá cansado de ser meio que a bússola moral do rap. Tipo, “what Kendrick would do?”, enquanto ele é só mais um cara (em “Savior” ele deixa isso bem reforçado). Esse é um ponto da abordagem que eu até curto, mas acho que o meu dilema principal com este álbum é que ele me parece atirar para todos os lados como música, produção, ideia. Numa segunda, terceira ouvida, ele dá uma melhorada, mas não brilha, não tem a consistência que eu esperava. Olha que em tese é um álbum duplo, mas musicalmente falando me parece o mesmo álbum. Tem alguns momentos que parece até que tá forçando “conceito” (como em “We Cry Together”).

Ainda tem “Auntie Diaries”, que OBSERVAÇÃO IMPORTANTE — não faço parte da sigla LGBTQIAP+, então a minha visão é muito mais de uma pessoa hétero aprendendo. Eu vi muitas pessoas que são LGBTQIAP+ falando bem da música, outras falando mal; então acredito que é importante ouvir as vozes das pessoas LGBTQIAP+, especialmente as pessoas trans, para entender a opinião delas sobre essa faixa. Li alguns artigos discutindo sobre o assunto (vindos da Them, Slate, NPR, The Root) e as opiniões ficaram bem próximas ao que eu estava sentindo ao ouvir a música: eu fiquei beeem incomodada com o uso da palavra com F, além de falar os “deadnames” dos parentes trans e os pronomes errados, então… É o famoso “de boas intenções…” Você me entendeu.

Destaque para “N95”, “Die Hard” (a única com cara de single, lembrando sempre que K-Dot não é artista de singles, mas de álbum coeso, e com cara de ROTY/SOTY)

Ainda bem que ele sabe que “can’t please everybody” porque sinceramente… Esse álbum não rolou pra mim.

Sobre chances de Grammy, minha opinião rápida é que as oportunidades que Kendrick tinha de ganhar o prêmio já foram… Não vai ser com esse álbum que vai rolar, que é BEM MENOS CONSISTENTE do que seus outros trabalhos.

Eu gosto muito do “Harry’s House” porque ele mantém o que é bom do Fine Line - as sensibilidades únicas de pop meio retrô que ele tem - e direciona para algo mais interessante, moderno, atingindo um público que pode ser tanto o mais alternativo quanto o mais radiofônico top 40 dos EUA — mas ainda com algumas leves referências ao lado mais rock n’ roll, que estava com força no primeiro álbum.

Tem influências de Prince (como em “Music for a Sushi Restaurant”) e A-HA, mas também tem a cara do Harry, e faz com que ele seja uma estrela pop diferente dos outros acts pop que estão no mesmo grupo dele.

(aliás, como eu sou meio cadelinha de linha de baixo retrô, então esse álbum já é winner pra mim)

Além disso, as letras são meio chill… Você consegue enxergar uma vibe verão, leve, gostosa, falando de amor, de relacionamentos ruins, ou mesmo desse sentimento de solidão e de que o tempo passa pra todo mundo — que é a de “As It Was”, com todo o jeitinho de indicado a Canção e Gravação do Ano.

Curiosamente, mesmo o álbum se chamando “Harry’s House”, boa parte das músicas tem nos versos informações sobre ele FORA: andando de bike, caminhando pela rua no domingo, passeando por NY, dirigindo… Só que na verdade, a casa não é uma casa “fisica”, e sim a casa da mente dele, é algo mais introspectivo.

Mas eu ainda acho que o meio-campo é meio irregular, e entendi que talvez seja a vibe dele mesmo — entrega um primeiro terço matador, meio meeiro e o final foda. Mesmo assim, é nesse meio “meeiro” que tem de longe a melhor letra do álbum, “Matilda”, um trabalho bem feito de storytelling, deixando a história da personagem vir à vida — deixar para trás o que é tóxico, recomeçar pelo próprio bem, e mesmo com as cicatrizes, é possível encontrar a felicidade — e o arranjo funcionar como background.

De novo, é o azarão por excelência no Grammy. Cuidado com Harry Styles, ele está chegando e tem serviços prestados.

O curioso é que falamos de dois álbuns que trabalham com introspecção, mas em “Harry’s House”, essa introspecção é construída pra gente, pro ouvinte, entender, e funciona bem, porque torna a experiência universal.

E vocês, o que acharam dos dois álbuns? Coloque sua opinião nos comentários!

--

--

Marina Teixeira
Marina Teixeira

Written by Marina Teixeira

writer, journalist and anxious overthinker

No responses yet